Mago Supremo - Cap. 190
Capítulo 190: Preso
Salaark se movia como o vento, seguindo o cheiro podre de caos que infestava o ar. Várias Abominações, tanto Fortalecidas quanto Manipuladoras tentaram pará-la, mas assim que a Salaark percebia que eles eram drones sem mente, ela os incinerava com uma rajada de fogo púrpura.
Logo ela chegou no centro do labirinto, uma caverna artificial preenchida com equipamentos de última geração. Era o laboratório mágico mais incrível que Salaark já havia visto.
— Eu pensei que apenas o Leegaain conseguiria fazer algo assim. Eu não consigo nem imaginar para que serve a maioria dessas coisas — disse Salaark, pensando alto.
Tanques transparentes de água preenchidos com um líquido amarelo brilhante estavam enfileirados contra as paredes.
Cada um continha uma fera mágica inconsciente ou um humano, mas todos eles estavam sendo lentamente transformados em Abominações. Salaark estava perto o suficiente para ver o processo em andamento. De alguma forma, os tanques estavam refinando forçadamente os núcleos deles, enquanto ao mesmo tempo o líquido amarelo mantinha os corpos estáveis.
— Interessante. Os corpos deles estão preenchidos com rachaduras, mas não devem colapsar até que eles alcancem pelo menos o nível ciano, talvez até mesmo azul. Nota para mim mesma, colocar o Leegaain para estudar o procedimento e simplificá-lo para mim. Dessa forma, eu conseguirei substituir minhas Penas com facilidade. Eu aceitarei isso como uma compensação parcial.
Uma moção da mão dela selou o espaço dos tanques, fazendo com que fosse incrivelmente difícil danificá-los. Salaark não estava com pressa, era impossível alguém escapar dali.
Ela caminhou pela sala, encontrando mais e mais maravilhas, assim como horrores.
Incontáveis corpos secos estavam empilhados em pequenos montes, fazendo ela se perguntar se eles eram experimentos que falharam ou simplesmente o alimento básico para desenvolver completamente tantas Abominações.
— Você está atrasada demais — berrou uma voz entretida. — O Mestre escapou há horas atrás.
Uma figura sinistra deu um passo para frente. Seu corpo estava coberto por escamas vermelhas brilhantes, com um líquido preto escorrendo entre elas. Ela tinha chifres longos e curvados onde seus olhos deveriam estar e grandes asas membranosas viradas de cabeça pra baixo em suas costas.
— Desde quando Eldritchs têm um mestre? — zombou Salaark.
— Seu poder te deixou arrogante, Guardiã. Seu orgulho te cega — disse a criatura, enquanto apontava para ela com um dedo que terminava em uma garra. — Nós aprendemos a aumentar nossos números com vocês. Não estamos mais espalhados. Lutamos como um…
— Não estou interessada em seu discurso. — Salaark cortou o discurso da criatura. — Me conte quem é o seu mestre e onde encontrá-lo. Seja um bom garoto e não farei você sofrer. Muito.
O sorriso lupino dela apenas fez com que a Eldritch começasse a rir alto.
— O orgulho precede a queda. — Um estalar de seus dedos escamosos e a caverna inteira ficou coberta por símbolos de poder. Cada centímetro do espaço foi coberto por incontáveis runas e formações mágicas, cada uma delas imbuída com um poder mágico que não pertencia a nenhum dos seis elementos.
Salaark sentiu sua força sendo sugada, mas ainda não demonstrou nenhum sinal de preocupação.
— Interessante. Após você ter secado toda a energia natural desse lugar, você também usou magia proibida para cortar minha conexão natural com a mana. Quantas Abominações você sacrificou para conquistar um resultado desses?
— Não o suficiente, já que você ainda tem forças para se gabar! — A Eldritch rugiu, estendendo seus braços para frente. Cada um de seus dedos se esticaram e se multiplicaram, preenchendo o ar com chicotes afiados parecidos com tentáculos que golpearam todo o espaço ao redor da Salaark.
A Eldritch estava indignada, mesmo sem usar magia, a Guardiã havia conseguido desviar de cada golpe com movimentos tão pequenos que eram quase imperceptíveis.
Quase.
— Eu diria que você escolheu o Guardião errado, mas não há um Guardião certo. A Tyris simplesmente ignoraria essa merda e tentaria conversar com você antes de te matar. Leegaain provavelmente destruiria suas formações com um espirro. E quanto a mim? Eu sou uma lutadora!
Salaark avançou, socando o ar na frente dela. A Eldritch sentiu todos os seus sentidos sendo distorcidos pela força por trás do ataque simples. A criatura desviou facilmente do golpe, mas ele ainda bateu nas paredes atrás da Eldritch, criando uma caverna com vários metros de profundidade e interrompendo várias formações.
— Eu odeio Guardiões! — A Eldritch não estava conseguindo mais segurar sua fúria. — Por que vocês são tão fortes? Por que vocês continuam nos subestimando? Eu sou Pazuel, e te mostrarei os resultados dos nossos esforços!
Pazuel enfrentou Salaark frente a frente, suas garras cortaram facilmente a carne e os ossos dela, a forçando a recuar pela primeira vez em vários séculos.
Parece que eu subestimei um pouco demais esse desgraçado. Nenhum Eldritch jamais conseguiu sequer me arranhar nessa forma. E para piorar ainda mais as coisas, não estou conseguindo reverter minha forma para meu corpo real.
As formações ao redor deles tinham sido feitas com um tipo de magia pervertida e distorcida que apenas Abominações possuíam. Essa magia vinha da magia das trevas, mas tinha sua conexão natural com a magia da luz forçadamente cortada.
Ela fortalecia suas habilidades individuais únicas e havia sido nomeada de magia do caos. Mais de cem Abominações tinham sido sacrificadas para fortalecer as formações, fazendo com que qualquer tipo de magia além da magia do caos fosse impossível.
O líquido preto escorrendo de Pazuel era uma materialização dessas energias, envenenando o corpo da Salaark e impedindo que ela regenerasse suas feridas.
Apesar de tudo isso, ela conseguiu lutar com a Eldritch em pé de igualdade, seus milênios de experiência fizeram com que cada um dos ataques da Eldritch parecesse telegrafados e previsíveis. Cego de raiva, Pazuel deixou ela se aproximar demais.
O punho dela atingiu o ombro esquerdo da criatura, o impacto transformou seu braço esquerdo e parte de seu peito em pó, fazendo seu corpo girar como um pião, voando contra uma parede.
— Por quê? Por que você ainda está tão forte assim? — gritou a criatura.
— Porque eu aceitei tudo que você já descartou um dia — disse Salaark, arfando. — Porque ainda estou lutando uma batalha sem fim pelo meu povo e por esse planeta, enquanto você não faz nada além de comer, cagar e chorar.
Salaark tinha esperado conseguir enrolar por mais tempo com o discurso dela, mas assim que o braço de Pazuel cresceu de novo, a criatura investiu pra cima dela novamente. Seu corpo começou a derreter, se expandindo ao mesmo tempo. Pazuel se tornou uma massa de unhas, garras e presas com apenas um núcleo preto como seu centro.
— Como você se atreve a dizer que não faço nada? Nós sacrificamos tanto para chegar tão longe, mas agora eu e meus irmãos somos um! — Cada membro e focinho disparou um feitiço diferente, deixando Salaark sem lugar nenhum para fugir.
Ela ainda conseguiu desviar da maioria dos ataques, tomando apenas aqueles que não acertariam seus pontos vitais. Quando a barragem de ataques acabou, apenas parte do torso e da cabeça dela sobrou, mas ainda assim ela estava viva.
— Se isso é o melhor que você consegue fazer, agora é minha vez. — A voz dela estava calma, chamas púrpuras cobriram todas as partes feridas do corpo dela, a tornando inteira novamente.
— Quê? Como? — Pazuel estava superaquecendo e a criatura foi forçada a reverter de volta para sua forma original
— Eu acumulei milhares de anos de experiência enquanto vocês ficavam satisfeitos em predar os fracos. Olhe para sua preciosa formação.
Foi apenas nesse momento que Pazuel percebeu como cada um dos ataques que Salaark havia errado na verdade tinham atingido seu alvo pretendido. Os pontos de foco da formação estavam todos muito danificados, até o lugar para onde ela tinha mandando a Eldritch se arrebentar voando havia sido intencional.
— Você fez o resto do trabalho para mim com seus ataques desleixados — explicou Salaark, enquanto as chamas púrpuras se tornaram brancas, junto com seu corpo inteiro. — Você cometeu um erro de cálculo. Esse lugar não está mais esvaziado da energia do mundo. Por quanto tempo essa formação de magia do caos poderia durar contra dois Guardiões respirando vida nova por todo o espaço ao nosso redor enquanto conversamos, com mais um terceiro Guardião quebrando essa formação do lado de dentro dela?
— Você acha que eu tenho medo da morte? Eu já sou parte de algo maior. Glória ao amanhecer de um novo mundo!
Salaark conseguiu ver a Eldritch sobrecarregar seu núcleo preto, causando uma poderosa explosão, forte o bastante para destruir a caverna e causar uma quantidade de dano considerável nela.
A resposta dela foi morder seus lábios escarlate e cuspir uma gota de seu sangue na Eldritch que estava explodindo. O tempo pareceu rebobinar, cada pedaço de carne voltou para onde estava, formando o corpo novamente e selando a explosão antes que a onda de choque conseguisse deslocar um grão de poeira sequer.
A Eldritch se encontrou viva e bem, com seu núcleo intacto. Ela começou a suar de medo, um sentimento esquecido há muito tempo, enquanto a mão da fênix se transformava em uma garra, prendendo a criatura onde ela estava. A Eldritch descobriu que seus músculos tinham ficado flácidos, sua magia se recusava a obedecê-la.
— Parece que há um mal-entendido aqui. — A forma da Salaark se transformou em um híbrido entre humano e fênix. — Eu não sou a protetora de nada, não sou a musa de ninguém. Eu sou a conquistadora da vida e da morte.
A mão livre dela se acendeu com uma chama branca, queimando até a alma da criatura.
— Você não vai para lugar algum, então é melhor você começar a falar.
***
Lith passou o resto do dia praticando magia dimensional e Acumulação enquanto esperava os livros escolares serem entregues e trabalhou nas caixas seladas durante a noite.
O tempo gasto com a Solus na torre praticando Maestria em Forja, junto com a aula da Nalear sobre a importância dos cristais mágicos, deram a ele uma nova abordagem para o problema.
Lith havia descoberto que o motivo para suas falhas anteriores era que ao danificar os caminhos de mana das caixas, a energia contida no pseudonúcleo diminuía, enquanto a energia contida no cristal de mana não.
Isso perturbava o equilíbrio e causava a explosão. Anteriormente, ele havia tentado manter o cristal isolado, pensando que ele era algum tipo de detonador que de alguma forma era ativado por suas tentativas de arrombar a fechadura.
Em vez disso, o que ele tinha que fazer era atacar os dois pontos ao mesmo tempo. Graças a essa descoberta, Lith agora era capaz de quase desativar a fechadura.
Infelizmente, quase não era o bastante. Agora ele era capaz de abrir as caixas, mas a explosão resultante ainda destruía a maior parte do conteúdo delas, sem deixar pra trás o suficiente para ele entender o propósito daquele conteúdo.
— Isso ainda é um sucesso enorme. Eu só preciso de mais algumas aulas sobre como cristais de mana e Maestria em Forja interagem entre si e eu conseguirei abri-las. Tenho apenas algumas sobrando, é melhor guardá-las para depois.
Quando o dia seguinte veio, ele ainda estava ponderando sobre as palavras do Yurial, dividido entre seu egoísmo e seu desejo de mudar, para se importar de verdade com seus tais amigos em vez de só fingir que se importava.
Sua rotina da manhã não mudou. Lith foi cedo buscar Phloria para a caminhada deles e então eles foram se encontrar com os outros para o café da manhã.
Isso realmente não se parece nem um pouco com um amorzinho de colégio. Ela não me convidou pro quarto dela, nós não conversamos sobre nada em particular. Mas a Phloria parecia estar mais alegre do que o normal. Ela sorriu com frequência quando conversou comigo e fez questão de se sentar na minha frente.
Isso significa que ela gosta da sua companhia e te admira. Solus destacou.
Isso ainda me parece mais com um amor que se sente por um amigo do que um romance de verdade. Lith pensou, dando de ombros.
Você assistiu dramas adolescentes demais. Baseado nas suas experiências passadas, relacionamentos precisam de tempo e esforço para se desenvolverem. Você se lembra do motivo pelo qual você nunca conseguiu se apaixonar, ao contrário do seu irmão?
De acordo com minha terapeuta, eu era muito egocêntrico. Eu me importava apenas comigo e em proteger meus próprios sentimentos, então eu nunca me abri para nenhuma das mulheres com quem eu saí.
É exatamente isso que você está fazendo, até agora. Você está pensando apenas no que você quer, não no que é melhor para ela. A Cédula é inútil para você. A Rainha está te apoiando abertamente, os Professores têm muita consideração por você.
Sem mencionar o quão forte e rápido você é. A situação não é a mesma de quando você chegou. Sua família está em segurança, você consegue se defender com facilidade e sua palavra não é mais a de um garoto do interior. Se qualquer coisa acontecer, a Academia te apoiará.
O mesmo pode ser dito da Phloria. Lith ainda não estava convencido.
Pelo meu criador, se eu tivesse um corpo, eu te daria um tapa, aqui e agora! A família dela não é tão poderosa quanto a Rainha. Além disso, há qualquer coisa que um estudante ou até mesmo um Professor consiga fazer com você se você usar todo seu poder?
Não.
É isso! Ela é jovem e ainda está traumatizada, enquanto você não hesitaria mesmo se arrancasse o coração de alguém antes do almoço. Ela precisa disso muito mais do que você.
Sabendo que estava no lado perdedor da discussão, Lith deixou a conversa pra lá e entrou no hospital da Academia, esperando com seus colegas que a aula de Curandeiro começasse.
Para a surpresa de todos, Manohar não apenas havia voltado, mas também estava encarregado da classe. Entre suas raras aparições, notáveis apenas por seus discursos de reclamação e os desaparecimentos constantes sem aviso prévio, a maioria dos estudantes quase se esqueceram da existência dele.
— Bom dia, meus queridos estudantes. Sejam bem-vindos de volta. Vocês com certeza tiraram uma longa folga da academia. — O tom de voz dele estava claramente irritado.
— Não foram eles que desapareceram por quase três meses, foi você!
O Diretor Linjos apareceu de repente de dentro de um Portal no meio da aula, seu rosto estava vermelho de raiva.