Mago Supremo - Cap. 187
Capítulo 187: Surpresa inesperada
Após o final da aula, o grupo foi para a cantina para comer algo e se recuperar do choque. Por meses eles tinham se mantido em estado de alerta por causa do Lukart e os capangas dele e agora o Professor Rudd estava se livrando dele.
Isso e o fato de que a Friya estava se juntando a eles como uma estudante de Rank A por completo era bom demais para ser verdade. Friya estava literalmente nas nuvens de tão animada. Ela estava tão feliz que a magia dela havia ficado fora de controle, fazendo ela flutuar alguns centímetros acima do chão.
— Guardem um lugar pra mim, vou me juntar a vocês em breve. Mal posso esperar para dar as boas notícias pro Orion, ele vai ficar tão orgulhoso de mim!
— A Quylla já está chamando ele de pai e o primeiro pensamento da Friya depois de sair da sala de aula foi dividir a alegria dela com ele. Seu pai deve ser um grande homem, Phloria. — O grupo se sentou na mesa de sempre deles. Era cedo demais para almoçar, então eles pediram lanches e bebidas.
Lith adoraria tomar uma cerveja gelada após ter suado tanto na tarefa que Rudd tinha colocado ele pra fazer, mas ele sabia que seu corpo ainda era jovem demais. Não importa quantas vezes ele pedisse, os funcionários da cozinha sempre se recusavam a servir álcool pra ele.
— Ele é mais do que isso, ele é um grande pai. Ao contrário da minha, ele nunca me deixou na mão nem tentou impor sua vontade sobre mim. É uma pena que ele frequentemente fica longe de casa por semanas e isso torna minha mãe a soberana das nossas terras.
Só de pensar na mãe dela, o gosto do suco que ela estava tomando já ficava azedo.
— Para ser honesto, estou muito surpreso que a Friya conseguiu Blinkar antes de você, Quylla. — Yurial expressou o que todos estavam pensando, enquanto Friya ainda estava longe, para não ferir os sentimentos dela.
— Eu não estou. — Quylla abaixou o olhar dela, envergonhada. — Apesar de eu ter dominado a tetra conjuração antes deles, a magia de fogo ainda é meu ponto fraco. Vocês se lembram de quando eu disse que comecei a praticar magia depois da morte do curandeiro da minha vila?
Todos acenaram.
— O que eu omiti quando disse isso é que os bandidos botaram fogo na vila e eu quase morri naquele dia. Desde aquele momento, eu tive medo da magia de fogo. O fogo é diferente dos outros elementos, mesmo sem mana ele não desaparece, ele continua crescendo e queimando, como se estivesse vivo.
“Por causa disso, eu nunca pratiquei muito a magia de fogo, mas agora as coisas mudaram. Não sou mais aquela garotinha medrosa, eu vou alcançar vocês em pouco tempo!”
Quando a Friya voltou, todos já estavam comendo e bebendo. Lith decidiu aproveitar aquele momento quando todos estavam com a guarda baixa para fazer sua pergunta da forma mais casual possível.
— Fico feliz em ver que todos vocês estão bem humorados. Mas isso me deixa com uma pergunta. Por que nenhum de vocês me ligou? Vocês fizeram eu ficar pensando que queriam cortar laços comigo. — Apesar de todos seus esforços, Lith acabou mexendo seu copo enquanto ele estava falando.
— Eu sinto muito por isso. — Friya abaixou seus olhos, seu sorriso já havia desaparecido. — É só que depois que eu ouvi sua história, fiquei envergonhada por ter te tratado tão friamente. Depois que eu percebi que seu fardo é muito mais pesado que o meu, eu me senti como uma criança chiliquenta exigindo por atenção. Eu não sabia o que falar sem acabar bancando mais ainda uma tola.
— Aquilo não era uma competição de sofrimento! — Lith parecia estressado, mas na verdade estava aliviado com a resposta dela. Como a Phloria parecia estar pensativa, ele olhou para a Quylla.
Ela abriu e fechou a boca dela algumas vezes, como se estivesse prestes a dizer algo mas mudou de ideia no último momento.
Pelos Deuses, por que eu sou tão covarde? Eu só preciso contar a verdade pra ele. Sobre como depois que ele foi embora da casa Ernas, eu precisei organizar meus sentimentos, para entender o que era e o que era só faz de conta.
Fala pra ele o quanto você sentiu a falta dele, mas estava com medo demais de ser rejeitada de novo. Não é tão difícil assim, tenho certeza que a Phloria falaria isso de uma vez só.
— Bem, eu precisava de um tempo para organizar meus sentimentos — disse a Phloria, com uma cara séria, fazendo a Quylla cuspir o que estava bebendo de volta pro copo enquanto Lith virava levemente sua cabeça, confuso.
— Que sentimentos? Os que você tem pela sua mãe? Pelas suas novas irmãs? Ou sobre a epifania de que cedo ou tarde você terá que matar alguém? — perguntou Lith.
— Nenhuma das alternativas anteriores — disse Phloria enquanto balançava sua mão, colocando todos aqueles tópicos de lado. — Sabe, quando ela não está tentando mandar em mim e me dizer como devo viver minha vida, minha mãe é uma ótima ouvinte. Ela conhece a natureza humana muito bem e as pessoas são apenas livros abertos para ela. Por mais que me doa admitir isso, eu não sou exceção nenhuma a isso.
“Depois que você foi embora da minha casa, fui deixada com um sentimento esquisito. Quando eu falei sobre isso com minha mãe, ela me ofereceu a visão dela e sugestões em vez de tentar me manipular, o que foi um evento revigorante.
“Ela pontuou que já tenho quinze anos e não vou ficar mais jovem. Ano que vem farei dezesseis e me tornarei uma adulta. Ou eu decido que vou me casar ou decido que não vou, ainda não tenho experiência nenhuma com garotos e assim que eu me juntar ao esquadrão do meu pai, as coisas ficarão sérias.
“Será matar ou morrer, sem meio termo nem tratos. Então eu decidi aproveitar meu último ano como uma criança ao máximo e sair da minha da concha. Lith, você gostaria de sair comigo?”
O rosto do Lith congelou com um sorriso sinistro enquanto Quylla estava engasgando com a bebida dela.
— Nossa, não vem pra cima de mim desse jeito. Espera até o quinto encontro pelo menos ou algo assim — zombou Phloria, depois do Lith ter permanecido travado na mesma pose por vários segundos.
— Desculpa, mas dizer que isso é inesperado chega a ser um eufemismo. Além disso, estou lisonjeado pelas suas atenções, mas nunca pensei em você desse jeito.
— Tá tudo bem. Eu não gosto de você de verdade, se é que isso importa — respondeu Phloria, ainda animada.
— Ok, agora você me perdeu. Se você não sente nada por mim, por que me chamou pra sair?
— Não é que eu não tenho sentimentos por vocês, é mais que eu ainda não entendo eles. Até agora, todos os garotos da minha idade que encontrei eram ou sonhadores imaturos que ainda acreditam ser destinados a algum dia derrotar monstros e salvar uma princesa, ou adolescentes tarados que só querem se enfiar nas calças de uma garota, igual o Yurial.
— Ei, eu me arrependo do que fiz! — Yurial ficou vermelho até as orelhas.
— Cara, eu estava lá quando você flertou com suas garotas do dia. Eu até te chamaria pra sair se eu não tivesse certeza de que a primeira coisa que você faria é colocar sua mão na minha bunda.
Yurial abaixou seus olhos, incapaz de negar a verdade das palavras dela. Ele era bem inconstante com garotas, para descrevê-lo de uma maneira educada.
— Lith, você é o garoto mais pé no chão e maduro que eu conheço. Seja política, literatura ou artes místicas, eu sempre consigo ter uma conversa boa com você. Eu gostaria que começássemos como amigos para vermos como as coisas se desenrolam.
Devo admitir que a oferta dela é interessante. Nunca tive uma namoradinha no colégio. Elas eram todas um bando de crianças imaturas, enquanto eu estava ocupado mantendo minha bolsa escolar e meus empregos de meio período.
Essa poderia ser a oportunidade para experienciar o que eu pensei que havia perdido para sempre. O problema é que eu não gosto dela dessa forma, ela ainda é uma criança aos meus olhos. Nessa idade, as coisas evoluem rápido e eu não quero estragar nossa amizade antes mesmo dela começar.
O que você acha disso, Solus?
Por que você tá perguntando pra mim? Ela estava honestamente surpresa.
Como eu disse, não gosto dela. Mas o mais importante é que não quero machucar seus sentimentos. Nosso relacionamento pode ser complicado às vezes, mas eu não o estragaria por nada nesse mundo.
Aquelas palavras fizeram a Solus chorar de alegria, mas ela escondeu todas as suas emoções em um canto da mente onde Lith não conseguiria as encontraria, a menos que ele procurasse explicitamente pelas memórias dela.
Obrigada, mas você não precisa se preocupar comigo. Você não se lembra de como eu te empurrei pra cima de todas as garotas que conhecemos? Eu sempre acreditei que você precisava de alguém para confiar, fora da sua família. Alguém que é mais do que só uma voz na sua cabeça.
Você é muito mais do que só uma voz na minha cabeça! Lith ficou indignado com a autodepreciação da Solus.
Você é minha parceira em combate, minha confidente. Você é o único motivo pelo qual eu não me transformei no monstro que tenho medo de me tornar se eu perder meu último fiapo de humanidade.
Mas ainda assim, eu sou só uma voz na sua cabeça. Levou oito anos para eu obter minha forma de orbe. Talvez em mais oito anos eu conseguirei algum tipo de corpo etéreo, que levará mais oito anos para materializar.
Você acha mesmo que consegue evitar contato humano por dezesseis humanos, nunca segurar a mão de alguém, beijar ou dormir com uma mulher? Quando você conheceu a Nalear e a Nindra, você teria chamado elas pra sair se não fosse pela diferença de idade. Isso é tudo que eu tenho a dizer, a vida é sua e a escolha também.
No espaço mental deles, o tempo passou muito mais rápido do que no mundo exterior. A conversa deles mal havia durado um segundo.
Bem, eu terei uma namoradinha e talvez isso ajudará a Quylla a me superar. Não é como se eu fosse me casar com a Phloria, provavelmente as coisas não darão certo nesse relacionamento. Eu diria que as vantagens são maiores que as desvantagens.
Apenas uma coisa. Adicionou Solus. O que quer que você faça, isso não é uma das suas negociações. Ela é uma pessoa real, com sentimentos reais, não trate ela como um risco calculado, procurando por um ganho. Senão, eu ficarei muito decepcionada com você.
— Eu adoraria sair com você — respondeu Lith, com seu melhor sorriso, enquanto as palavras da Solus ainda estavam ecoando em sua cabeça. — O único problema é quando e onde. A academia toma quase todo nosso tempo livre e não há nada pra fazer por aqui.
— Sem problemas. — Phloria estava radiante, muito mais do que Lith esperava. — Durante o fim de semana, podemos ir para qualquer lugar, graças ao Portal da academia. Você se importaria se déssemos uma volta agora? Tenho tantas coisas que quero conversar com você agora mesmo.
Lith se levantou e deu tchau para seus amigos, que ainda estavam paralisados.
— Eu nunca esperei por essa. — Yurial foi o primeiro a se recuperar. — De todas as garotas da academia, a Phloria é a última que eu esperaria que fosse ir pra cima do Lith. O mais chocante é que ele não a rejeitou, igual fez com todas as outras garotas. Talvez ele não seja feito de pedra, como sempre pensei.
Um soluço fraco parou o monólogo dele. Quylla estava à beira de chorar, enquanto Friya estava dando um abraço apertado nela, tentando consolá-la.
— Tá tudo bem, não é o fim do mundo — disse Friya.
— É tudo culpa minha — disse Quylla, soluçando. — Eu tive incontáveis oportunidades com ele mas desperdicei todas, sempre esperando pelo momento certo em vez de criá-lo, como a Phloria fez. Estou me sentindo tão estúpida. Eu me iludi em acreditar que havia mudado, mas ainda sou uma covarde.
Yurial e Friya ajudaram ela a se levantar e levaram Quylla para seu quarto, antes que a cantina inteira percebesse o estado dela.
Enquanto isso, Lith e Phloria estavam caminhando pelos corredores, com a Phloria falando na maior parte do tempo e listando todos os lugares que ela queria visitar no Reino de Griffon.
De repente, Lith percebeu que eles estavam na frente do quarto da Phloria.
— Pode entrar. Eu quero te contar uma coisa, mas não quero que ninguém mais ouça.
Lith estava hesitando.
Ela já me levou pro quarto dela? Isso não está apenas evoluindo rápido, está pulando todos os estágios anteriores!
Quando ela percebeu, Phloria deu risadinhas.
— Vamos, eu não vou te devorar. Ainda não.
Phloria fechou a porta atrás deles. E então, sem dizer uma palavra, ela o deu um abraço apertado.
— A verdade é que depois do segundo exame, eu sempre estou com medo. Dentro daquela masmorra, eu percebi que a morte está mais perto do que eu pensava. Eu treinei minha espada e minha magia, acreditando que eu me tornaria invencível, mas agora eu sei que isso era só uma ilusão.
“Quando aquele ogro quase me matou, tudo que eu consegui pensar foi que eu nunca mais veria minha família novamente, que eu ainda não tinha experienciado o amor ou o toque de um garoto. Ainda tem tantas coisas que eu quero fazer e lugares que eu quero ver.
“Eu não quero morrer com tantos arrependimentos.”
Lith abraçou ela de volta, acariciando a cabeça dela enquanto tentava entender o que aquilo tudo tinha a ver com ele. Ele tinha certeza que Phloria nunca havia demonstrado nenhum sentimento romântico por ele e a Solus havia sempre confirmado a impressão dele.
Aquela virada de acontecimentos ainda era incompreensível para ele, mas ele permaneceu em silêncio. A lógica dele apenas atropelaria os sentimentos dela.
— O verdadeiro motivo pelo qual eu te chamei pra sair é que apesar de você ser mais baixo que eu, mesquinho, frio, e os Deuses sabem o quanto você me lembra minha mãe, sempre que estou com você, meu medo se esvai.